Promessas e conciliações

Panorama da aviação no pós-Covid 19, segundo a organização seguradora Mapfre Global Risks

Não tenho bem presente em que altura começou a haver uma vice-presidência nos governos dos Açores. Em 1996, ao ser constituído, pelo Partido Socialista, um governo minoritário como alternância ao exercício de vinte anos de poder pelo PSD, a opção foi mostrar que bastava uma equipa mínima: cinco Secretários Regionais, além do próprio Presidente Carlos César. A condução dos destinos regionais pelo PS veio a durar vinte e quatro anos e a sua última equipa, formada por muito mais do que as ditas cinco Secretarias iniciais e já presidida por Vasco Cordeiro, tinha como Vice-Presidente, a acumular com a pasta das finanças, Sérgio Ávila, que é tido, por alguma imprensa, como um dos maiores responsáveis pela política de disfarçar as dívidas públicas nos Açores. Pois foi esse vice de Vasco Cordeiro que, em 2019, assumindo-se como tutela direta da SATA, a par da Secretaria dos Transportes, tratou da escolha de um novo Conselho de Administração para substituir, desde 2020, o anterior que, havia um ano e meio, se vinha debatendo com sucessivas dificuldades resultantes sobretudo de faltas de financiamento. 

As condições postas pelo convidado Luís Rodrigues para constituir a nova equipa de gestão traduziram-se no que tem de ser considerado um importante alívio para a gestão corrente: passou a ser disponibilizado mesmo mais dinheiro para sustentar a empresa. O facto de Sérgio Ávila ser Vice-Presidente na altura terá facilitado a assunção do compromisso. E terão sido muitos milhões: as dívidas eram (e continuam) assustadoras, a renovação da frota de jatos para os A321NEO já estava em curso e qualquer “reestruturação” implicaria investimentos de vulto. A União Europeia exigia, para a concessão de ajudas de Estado, que fosse privatizada a Azores Airlines e que não se verificassem acréscimos de frota, de rotas nem de trabalhadores. 

Porém, a reestruturação dos recursos humanos tem de ser considerada, no mínimo, controversa – a concessão de pré-reformas a quem quer que, com idade superior a 55 anos, se candidatasse, incluindo técnicos altamente qualificados que tiveram de ser, como consequência, substituídos de seguida, só podia traduzir-se em duplicação de custos! As rescisões por mútuo acordo, designadamente com pessoal navegante e de manutenção, implicaram a sua imediata substituição. Mas não faltou financiamento.

“Assim, também nós”, poderiam afirmar anteriores administrações que haviam formulado planos de restruturação! E poderiam acrescentar que, em vez de ir presidir à TAP, seria bom de ver Luís Rodrigues a continuar o segundo mandato para que foi nomeado há poucos meses para a SATA, agora a demonstrar como gerir com menos fundos e com custos acrescentados.

A pandemia que fez paralisar o transporte aéreo logo a seguir à entrada da nova Administração em 2020, constituiu uma grave ameaça, mas também se terá traduzido num alibi, a reduzir as expetativas, as pressões e as eventuais críticas sobre planos estratégicos menos consistentes. E também terá facilitado o financiamento. 

A habilidade na comunicação e as pontes com as expetativas das tutelas, dos passageiros e dos trabalhadores permitiu um balanço positivo. O convite para ir gerir a TAP veio, pois, bem a calhar, traduzindo-se também num escrutínio público a avalizar a capacidade de gestão demonstrada.

Esta experiência deixa alguns resultados a ponderar: desde logo, mostra que, quando são nomeados açorianos para gerir a SATA, cedo a proximidade, ou o conhecimento pessoal, leva os políticos no governo a descuidar as dotações financeiras adequadas. 

O mais criticável nesta decisão de “transferir” administradores da SATA para a TAP, contudo, parece-me ser a desvalorização da própria missão e do pensamento estratégico da nossa companhia de aviação: – que estas, ou outras pessoas, conhecedores de todos os meandros da vida de uma empresa que geriram durante mais de três anos, possam levar esse conhecimento e utilizá-lo para passarem a gerir a sua concorrência sem que ninguém se oponha, ou escandalize, expressa bem a principal razão porque Estado se afunda um pouco sempre que põe os governantes a decidir sobre quem gere as empresas.

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Publicado por José Adriano Avila

Quadro da aviação comercial aposentado. Formado em Comunicação Social. Estuda Relações Internacionais.

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